
Não seria fácil para uma filha de Dorival Caymmi fazer da música um modo de vida, em decorrência das inevitáveis comparações. Contudo, Nana Caymmi, com apenas 19 anos em 1960, mostrou que não viera ao mundo para brincadeiras. Ao lado do pai, gravou Acalanto, uma linda canção de ninar que a mãe, Stella, desistira de registrar horas antes de entrar no estúdio. Atire a primeira pedra quem não se comoveu ao escutar trechos como: “Boi, boi, boi, boi da cara preta / Pega esta menina que tem medo de careta”, de doçura equivalente ao alcance vocal. Em 1966, ela venceria a fase nacional do I Festival Internacional da Canção no Maracanãzinho, ao interpretar Saveiros, de Dori Caymmi, seu irmão, e Nelson Motta: “Nem bem a noite terminou / Vão os saveiros para o mar / Levam no dia que amanhece / As mesmas esperanças /Do dia que ou”. Em 1967, na terceira edição do Festival de Música Brasileira, apresentou Bom Dia, pequeno clássico composto com o então marido, Gilberto Gil: “Madrugou, madrugou / A mancha branca do sol”.
A imensa capacidade de criar gravações inesquecíveis e de evidente bom gosto, marcado pelo vozeirão incomparável, era o contraponto a um jeito de ser um tanto severo, pleno de certezas, muitas vezes agressivo — mas que a arte ajudava a deixar em segundo plano. Em 2018, ela apoiou a candidatura de Jair Bolsonaro para a Presidência. Entre xingamentos, brigou com amigos do mundo artístico. “Só de tirar PMDB e PT já é uma garantia de que a vida vai melhorar. Agora vêm dizer que os militares vão tomar conta? Isso é conversa de comunista”, disse. Gil, sempre elegante, pôs panos quentes na confusão, ao comparar a postura de Nana com a da mãe, Stella. “Para o melhor, na apreciação eloquente do seu entorno de bem querer e afeição. Para o pior, na vociferação raivosa da sua inquietação para com os que parecem fugir do seu controle.” No enterro da ex-mulher, com quem foi casado de 1967 a 1969, Gil deu a régua e o como, comovido: “A música nos envolvia de forma muito intensa. Eu começando meu trabalho, ela vindo egressa de uma família com uma presença musical extraordinária, pai, mãe, irmãos. O violão sempre era uma presença constante em nossas vidas, estava ao pé da cama”. Nana morreu em 1º de maio, aos 84 anos, depois de nove meses internada, ao realizar um cateterismo e implante de marcao.
A freira para lá de centenária 4g4l57

Em janeiro, o Guinness, livro dos recordes, registrou a freira brasileira Inah Canabarro Lucas, de 116 anos, como a mulher mais velha do mundo. Torcedora fanática do Internacional de Porto Alegre, ela dedicou boa parte de sua vida adulta à educação — um de seus alunos foi João Figueiredo, o derradeiro presidente dos governos militares. Com a morte da brasileira, de causas naturais, ocorrida em 30 de abril, um mês antes de festejar os 117 anos, o posto de longevidade feminina está agora com a britânica Ethel Caterham, de 115 anos.
Publicado em VEJA de 9 de maio de 2025, edição nº 2943