Mulheres correm risco cardíaco, mas desconhecem sintomas 231p5z
Estudo mostrou que apenas 6,7% das entrevistadas entendem que hábitos saudáveis afastam riscos de doenças no sistema cardiovascular 3v5g5d

Uma pesquisa publicada recentemente na revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp), cujo objetivo foi investigar o conhecimento de mulheres a respeito dos fatores de risco da saúde cardiovascular feminina, trouxe dados preocupantes sobre a falta de consciência de que mudanças comportamentais relativamente simples são vitais para afastar riscos de doenças que podem desencadear graves impactos e até levar à morte.
Apenas 6,7% das entrevistadas declararam que hábitos saudáveis – como se alimentar bem e atividade física regular – têm impacto positivo para a saúde do coração. O achado do estudo comprova o que percebemos no consultório: as mulheres acreditam que, ao tomarem medicações para o controle da pressão arterial ou diabetes, por exemplo, já estarão protegidas contra doenças cardiovasculares (DCVs).
Muitas vezes, os remédios serão necessários, porém, o estilo de vida é o pilar para proteger e tratar males do sistema cardiovascular. Mas o grupo reconheceu situações que levam aos problemas cardiovasculares: 71,2% concordaram sobre os riscos do tabagismo, 66,3% citaram o histórico familiar para as doenças e 51,9% afirmaram que a hipertensão contribui para essas patologias.
Já ao analisar a percepção quanto a sintomas associados às doenças cardiovasculares, dor ou desconforto no peito e em membros superiores foram identificadas por, respectivamente, 74,0% e 59,6%. Cansaço constante, perda de força, sudorese ou suor frio foram apontados como sinais de algo errado com o coração por 57,7%.
Considerando que a maioria das participantes fez o ensino médio e o superior completo ou incompleto, as respostas para esses quesitos ficaram aquém do ideal, provavelmente por carência de entendimento, o que pode ocasionar negligência em ações emergenciais ao encararem um quadro potencialmente perigoso.
Um fato chamou a atenção dos pesquisadores: mais de 45% das consultadas viviam com obesidade ou apresentavam sobrepeso. A obesidade está relacionada a maior incidência de doenças cardiovasculares, respondendo pelo aumento da mortalidade em até 2,8 vezes. A elevação do risco de morte nesses casos é associada à presença de hipertensão arterial, diabetes tipo 2 e colesterol alto, entre outras comorbidades, além da doença obesidade por si só.
Exclusividade feminina 5s726k
As doenças cardiovasculares são responsáveis por 35% das mortes anuais de mulheres. De certo modo, os resultados deste trabalho nos fornecem indícios de como chegamos a este percentual: a pouca efetividade pode vir também do desconhecimento das possibilidades de combate dessa verdadeira epidemia, muitas delas medidas ao alcance de todos. Manter dietas balanceadas, praticar atividade física, controlar parâmetros de diabetes e colesterol, dormir bem e evitar situações de estresse fazem parte dessas iniciativas.
Estar informado sobre o que mantém ou não a saúde cardiovascular é relevante para todos, mas é fundamental para as mulheres conhecer o que abre precedentes, os sintomas e os meios de controle. Mesmo diante de fatores comuns a ambos os sexos, em algumas situações, os impactos nelas serão mais preocupantes.
]É o caso do diabetes, hipertensão e do tabagismo, cuja probabilidade de desencadear doenças cardiovasculares é 25% maior em relação aos homens. Também se comprovou que depressão, ansiedade e estresse mental agudo são mais recorrentes nelas. O excesso de preocupação com a família, a falta de prioridade com a própria saúde e a dupla – ou até tripla – jornada que inclui vida doméstica e trabalho, podem justificar. Muitas vezes, a autonegligência em prol de cuidados com terceiros leva a tais desfechos.
Mulheres ainda precisam driblar riscos exclusivamente femininos: síndrome dos ovários policísticos, falência ovariana precoces, complicações gestacionais, eclâmpsia, pré-eclâmpsia, histórico de câncer de mama e seus tratamentos, assim como prevalência de doenças autoimunes/inflamatórias (lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide e síndrome do anticorpo antifosfolípide).
Além disso, a anatomia coronariana feminina propicia incidência superior de doença arterial aterosclerótica. Elas têm artérias coronárias menores e de menor calibre, o que provoca síndromes obstrutivas coronarianas. Devido ao estresse e aos níveis hormonais, elas tendem a desenvolver erosões de placas coronarianas, ruptura, embolização distal, espasmo e dissecção coronariana espontânea mais frequentemente do que eles, sendo a doença coronariana não obstrutiva mais prevalente e evidente nelas.
E não para por aí: na menopausa perde-se a proteção do estradiol. O hormônio estimula as células endoteliais a liberarem óxido nítrico, substância que promove a vasodilatação e melhora o fluxo sanguíneo, colaborando para a manutenção da pressão arterial e minimizando risco de aterosclerose. O estradiol ajuda a manter um perfil lipídico saudável, reduzindo o colesterol LDL e aumentando o colesterol HDL, essencial para a prevenção de doenças cardiovasculares, o que se inverte na transição da menopausa.
Prescrição médica: informação ível 36my
A compreensão de que homens e mulheres são impactados de maneira distinta pelas mesmas doenças também deve ser disseminado entre os profissionais de saúde: sem esta noção não serão efetivos para atuar em favor das pacientes. Mulheres podem ter sintomas inespecíficos iniciados dias ou até semanas antes do episódio cardiovascular: fraqueza muscular em membros superiores, alterações de padrão do sono, ansiedade e fadiga. Tais manifestações atípicas retardam o diagnóstico e aumentam a mortalidade, muitas vezes pela falta de percepção do risco e subsequente tratamento inadequado.
A necessidade de suprir essa lacuna foi uma das conclusões do trabalho desenvolvido por pesquisadoras do Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (Unidavi): “(…) A alta prevalência de condições como sobrepeso, obesidade, consumo de bebidas alcoólicas e depressão é preocupante e aponta para a necessidade urgente de intervenções públicas direcionadas. É fundamental que futuros estudos e ações educativas considerem a alfabetização em saúde das mulheres (…)”. Por isso, é preciso utilizar “(…) abordagens mais claras e adequadas à linguagem cotidiana, de forma a garantir a efetividade na promoção do conhecimento e na adoção de hábitos saudáveis que reduzam o risco cardiovascular (…)”. Por fim, “(…) o estudo destaca a urgência de intervenções de saúde pública para enfrentar as lacunas identificadas entre as mulheres estudadas, visando reduzir a carga das DCVs e promover uma população feminina mais saudável e bem-informada (…).”
Vale lembrar que a internet e as redes sociais são de muita valia para alcançar vários nichos sociais e faixas etárias. Investir em esclarecimento é o caminho mais viável para a prevenção e, consequentemente, para diminuir as tristes estatísticas de doenças cardiovasculares em mulheres. E, nesse sentido, a Socesp promove uma campanha ao longo do mês de maio para levar esses esclarecimentos à população, além de manter um grupo, Socesp Mulher, voltado à conscientização, pesquisa e divulgação de temas ligados à cardiologia feminina. Entre suas ações, podcasts, palestras e publicações em veículos da mídia leiga, orientando sobre as especificidades das doenças cardiovasculares em mulheres.
* Nina Azevedo e Maria Teresa Bombig são cardiologistas e integrantes do Socesp Mulher, da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo